São Paulo — Prints de mensagens obtidos mostram que o autor do ataque a tiros que matou uma aluna na Escola Estadual Sapopemba, na zona leste de São Paulo, na última segunda-feira (23/10), foi incentivado e instruído a cometer o atentado por integrantes de um grupo do qual fazia parte no Discord, plataforma de conversas em texto, voz e vídeo popular entre os jovens.
Nas mensagens, trocadas horas antes do ataque, o adolescente de 16 anos fala sobre os preparativos para o que chama de “missão” e discute qual seria a melhor maneira de posicionar o celular para filmar e transmitir o atentado pelo servidor. Após o crime, os integrantes do grupo lamentam o saldo de vítimas. “Uma morte cara, q cara merda [sic]”, reclama um dos administradores do grupo.
As conversas estão em posse da Polícia Civil de São Paulo e do Laboratório de Crimes Cibernéticos do Ministério da Justiça, que investigam como integrantes do grupo no Discord estimularam o adolescente a realizar o ataque que deixou outras duas alunas feridas à bala. O atirador usou um revólver calibre 38 do pai. Ele foi apreendido em seguida e disse à polícia que agiu sozinho. A motivação seria uma reação ao bullying que ele sofria na escola por ser homossexual.
As mensagens mostram, contudo, que o autor do ataque compartilhou fotos da escola onde estudava em Sapopemba no grupo do Discord antes do atentado para pegar dicas de como executar o crime. Há imagens da sala de aula onde ele entrou armado por volta das 7h30 da segunda-feira e das escadas onde ele matou a estudante Giovanna Bezerra da Silva, de 17 anos, com um tiro na nuca, à queima-roupa.
Depois que o ataque ganhou o noticiário, integrantes do grupo demonstraram preocupação em serem descobertos pela polícia. “Eu vou formatar meu celular, desativar minha conta do Discord, sair desse serve e dos outros 10 [sic]”, escreveu um deles, às 9h16. “Eu vou até desativar minha localização”, digitou outro integrante, logo em seguida.
“Mas alguém daqui empurrou o cara p fazer? Pq aí sim vai dar merda [sic]”, questionou um terceiro membro do grupo no Discord. “Tava geral kkkkkk”, respondeu outro participante.
O Metrópoles decidiu não divulgar o nome do grupo no Discord do qual o adolescente fazia parte, nem os apelidos usados pelos integrantes, porque, como como mostram as próprias mensagens, o objetivo deles é, justamente, obter fama e prestígio no submundo da internet por meio dos atos de violência que praticam ou estimulam dentro e fora da plataforma.
Em maio deste ano, o Metrópoles mostrou que, por meio do mesmo Discord, jovens promovem sessões de tortura virtual com meninas, obrigando-as a se masturbarem ou se automutilarem diante da câmera, em transmissões ao vivo nos grupos fechados, a enviarem fotos nuas e até a mutilarem animais de estimação ou incendiarem mobílias. Tudo sob forte ameaça.
Horas antes do ataque
O material obtido pelo Metrópoles mostra o adolescente que matou a estudante de 17 anos dentro da escola na zona leste paulistana discutindo seu plano no grupo do Discord durante a madrugada da última segunda-feira (23/10), menos de cinco horas antes do ataque. Um dos integrantes do servidor pergunta onde seria o atentado e se ele iria fazer uma transmissão ao vivo da ação criminosa pela plataforma.
Segundo ele, havia tempo que não aconteciam “coisas interessantes” na “panela”, termo usado por integrantes (“paneleiros”) para se referir aos grupos de Discord. O adolescente promete, então, fazer um atentado “bem melhor” do que o executado em março, na Escola Estadual Thomazia Montoro, na Vila Sônia. Na ocasião, um garoto de 13 anos matou a facadas a professora Elisabeth Tenreiro, de 71 anos, e deixou outras duas feridas.
2h50 – Integrante – “[Vai ser] em qual bairro?”
2h50 – Adolescente – “Sapopemba”
2h50 – Integrante – “Brabo. […] Vai fazer em call?”
2h50 – Adolescente – “Sim”
2h51 – Integrante – “Que servidor?”
2h51 – Adolescente – “Naquele lá que agente tá conversando eu já combinei de fazer lá
Já ta marcado”
2h51 – Integrante – “Caralho…Vai ser foda então. Estava a um tempo sem coisas interessantes em panela”
2h52 – Adolescente – “Vai ser um bem melhor que o daquele mlk lá”
2h52 – Integrante – “Qual?”
2h52 – Adolescente – “Da faca, sabe?”
2h52 – Integrante – “Ah, sim Aquela criança mongoloide”