Os recordes de produção da Petrobras e a invasão de diesel russo no mercado brasileiro derrubaram os preços do combustível, fundamental para o transporte de cargas no Brasil. O cenário chegou a levar a maior refinaria privada brasileira a exportar o produto por falta de competitividade nas vendas internas.
Na semana passada, o preço médio do diesel S-10 nos postos brasileiros ficou em R$ 4,99 por litro, abaixo dos R$ 5 pela primeira vez desde maio de 2021. Na primeira semana de janeiro, o litro custava R$ 6,60, em valores corrigidos pela inflação.
Foi a 29ª semana consecutiva de queda, mesmo sem cortes de preços nas refinarias da Petrobras desde o dia 16 de maio, quando a estatal anunciou mudança em sua política comercial e abandonou a paridade de importação.
No mesmo mês, a Petrobras bateu recorde mensal de produção de diesel S-10, com 2,06 bilhões de litros, marca superada pelos 2,11 bilhões de litros em junho.
Ao mesmo tempo, o Brasil passou a ser invadido por diesel da Rússia, bem mais barato do que as importações dos Estados Unidos, o que contribuiu para reduzir os preços.
Em junho, por exemplo, o produto russo representou dois terços das importações brasileiras, batendo recorde em volume pelo segundo mês consecutivo. Foram 687 milhões de litros no mês, alta de 6,7% em relação ao recorde verificado em maio.
Segundo o especialista em combustíveis da consultoria Argus, Amance Boutin, o diesel russo chegou ao Brasil em junho por um valor R$ 0,19 por litro inferior ao diesel adquirido de outros países.
O número de compradores disparou, com mais empresas tendo acesso a alternativas de pagamento das importações que driblam os embargos financeiros estabelecidos após o início da guerra na Ucrânia.
“Quem consegue importar esse tipo de produto leva vantagem em relação ao resto do mercado”, diz Boutin, ressaltando que o Brasil se tornou o segundo maior mercado para o diesel russo, atrás apenas da Turquia.
Favorável aos caminhoneiros e com impactos positivos no custo dos alimentos, o excesso de oferta de diesel no país tem causado dificuldades para produtores.
Controladora da Refinaria de Mataripe, na Bahia, a Acelen, por exemplo, já teve que enviar cargas de diesel ao exterior por falta de condições para disputar o mercado brasileiro.
A própria Petrobras chegou a realizar dois leilões de diesel para liberar espaço em seus tanques, segundo informações do mercado. Nesses leilões, recebe pelo produto valor ainda menor do que o que vem cobrando oficialmente pelos produtos, já defasado em relação às cotações internacionais.
Na abertura do mercado desta segunda-feira (24), o litro do diesel vendido pela estatal estava, em média, R$ 0,59 abaixo da paridade de importação medida pela Abicom (Associação Brasileira dos Importadores de Combustíveis).
Considerando refinadores privados, a defasagem média do diesel brasileiro é de R$ 0,55 por litro.
A Petrobras abandonou o conceito de paridade de importação em sua nova política de preços e diz que agora define os valores considerando também custos de produção e a competição pelos clientes. Desde então, mantém seus preços abaixo das cotações internacionais.
A defasagem calculada pela Abicom nesta segunda é a maior desde o fim de outubro de 2022, quando a empresa represou alta das cotações internacionais do petróleo para evitar reflexos negativos à campanha pela reeleição do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).
Logo após a derrota de Bolsonaro no segundo turno, a estatal aumentou os preços.
Concorrentes reclamam das elevadas defasagens e dizem que a Petrobras sentirá impactos em sua rentabilidade, que já devem ser vistos em seu balanço do segundo semestre, com divulgação prevista para a primeira semana de agosto.
“Preços dos combustíveis significativamente abaixo das cotações internacionais podem desencorajar outras empresas a importar os volumes necessários para suprir o mercado”, escreveram há duas semanas os analistas Bruno Amorim, João Frizo e Guilherme Costa Martins.
Assim, a Petrobras poderia se ver obrigada a garantir o abastecimento sozinha, com risco de prejuízos pela venda de produtos abaixo do preço de custo, como ocorreu durante o governo Dilma Rousseff.
Os analistas ponderam, no entanto, que a estatal se beneficia dos altos preços do petróleo por ser uma grande produtora, o que mais do que compensa as perdas na venda de combustíveis abaixo das cotações internacionais.
Procurada, a Petrobras não comentou o assunto até a publicação deste texto. (BN)